domingo, 21 de janeiro de 2018

Em linhas tortas (18)

Circula nas redes sociais uma intervenção repartida em dois áudios da empresária Filomena de Oliveira, da província da Huila, feita no parlamento por ocasião da aprovação do novo Orçamento Geral do Estado. A intervenção é pontuada pela frontalidade com que coloca à mesa assuntos que muitos angolanos abordam em bares e em um ou outro espaço radiofónico ou de TV, mas com aquele velho receio de arcar com as consequências de um possível fechar de portas. Alguém disse a brincar que não sabia mesmo se à sua chegada ao Lubango a empresária não encontraria uma nota de demissão. Claro, não só isso não vai ocorrer (por motivos óbvios), como também a corajosa Filomena de Oliveira (que se a memória não nos trai já apareceu no espaço mediático como historiadora, para além de ter sido por volta do ano de 2003 uma das primeiras representantes da Unitel na Huila) é daquelas vozes com um garantido "alvará dos deuses" para dizer o que pensa. O que sua excelência eu reteve foi uma referência às nossas universidades (cotadas abaixo das do Lesotho em termos de padrão de qualidade) e que, no entender da empresária, são "centros de papagaios" e não "centros de produção do saber". E este papagaio que vos escreve, com quase 40 anos de idade e mais de metro e setenta de altura, considera entender bem o que se quis dizer. Uma das preocupações nos últimos oito anos tem a ver com a proliferação de palestrantes de auto-motivação, assim como de "obras literárias" de auto- ajuda. Parece estranho que nos anos em que o acesso à universidade era complexo (antes de 2006), o auto-didactismo tenha incentivado o hábito do debate, das análises, das pesquisas, das bibliotecas, com uma ajudinha das ONGs e das rádios. Curiosamente, hoje, já num contexto mais favorável, quando cada vez mais gente formada é lançada ao mercado do trabalho, a internet é mais acessível, o que temos a prosperar e a ser imposto pela comunicação social como modelo de sucesso é precisamente a "consagração" do mercado de sábios (de português polido) que usam das suas opiniões, conselhos, frases feitas e lugares-comuns para "formar mentes". Põe-se de parte a análise profunda, o recurso à lógica, paradigma epistemológico e a confrontação/sustentação de ideias. Quando uma sociedade (constituída formalmente por intelectuais) se reúne por horas e horas a aplaudir opiniões de oradores charmosos cuja idade e experiência de vida nem sempre seriam suficientes para lhes conferir a autoridade de assumir o posto de influenciadores de mentalidades e destinos nos ramos que se propõem, a pergunta é mesmo esta: O que andará a universidade a fazer senão reproduzir papagaios? Ainda era só isso. Obrigado. Assina: sua excelência eu (que pensa Angola e não se dirige a ninguém em particular).
www.angodebates.blogspot.com | Gociante Patissa, 21 Janeiro 2018
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