sábado, 23 de dezembro de 2017

Crónica | Que se mantenha ao menos a tradição dos directos

Hoje voltei a sentar-me ao computador para conceber um programa de rádio. De 2002 para cá, é pela quarta vez que o faço no quadro de um amor platónico que me liga à rádio. Penso num esteio entre o livro e a tradição oral, um pouco de informação do mundo cultural e meter entrevistas no barulho. Vão perguntar se a minha utopia de criar uma a rádio avançou ou se recebi convite para colaborar em uma e assim alargar as fontes de receitas, certo? A resposta é não. Então para quê matar a cabeça no vazio?

Ora, pode ser uma "pancada" de família, afinal o meu pai chegou a mobilizar um motorista e o seu cobrador antes de chegar o carro, uma camioneta impingida com catálogos e factura pró-forma da Cosal por um burlesco correligionário a pretexto de reconhecimento do Comité/Governo Provincial de Benguela, pelo sacrifício consentido.

Foi em 2002 que estruturei o primeiro programa, muito cru ainda em cultura geral, habilidades ao microfone e gestão de tensão de estúdio. Apresentei-o à Rádio Morena Comercial (RMC), foi depois encaixado como rubrica quinzenal de meia hora no "Tarde Viva", de Ekumbi David, estrela do entretenimento. Ficcionei cenários difíceis para discutir desfecho com ouvintes ao telefone. Tal aventura resultara da insatisfação pelo facto de, em finais da década de 1990 na Rádio Lobito, a locutora Kieza Silvestre deixar de citar os autores das estórias que lia no seu programa, João Paulo Segundo e eu.

O espaço e o estagiário auto-didacta acabaram por não acrescentar valor à grelha, pelo que a sua duração foi curta. Mas foi suficiente para lançar a semente de uma relação cordial com o colectivo da RMC, dirigido por José Lopes. Na verdade, anos antes já havia tentado no casting, em resposta ao anúncio comandado por José Cabral Sande, não tendo na ocasião o mínimo de potencial para sobreviver ao crivo documental.

Em 2003, estruturei para espaço de antena pago na RMC o programa "Palmas da Paz". Era Coordenador Executivo e mentor do sistema de comunicação institucional ao serviço da ONG AJS (Associação Juvenil para a Solidariedade). Uma hora semanal de debate sobre reconciliação, cidadania e prevenção de conflitos no contexto pós-guerra, às vezes “incómodo”, dada a pluralidade e temas candentes. Nessa altura, para além de "devorar manuais", trazia na bagagem um curso básico de jornalismo do centro do padre Passagem.

Em 2006 criamos o "Viver para Vencer", também da AJS, desta vez com a dicotomia cidadania e saúde preventiva. Introduzimos o drama radiofónico e uma rubrica de homenagem com entrevistas de perfil a pessoas anónimas que são pela sua vivência um exemplo de persistência e motivação. Alargamos igualmente o tempo para hora e meia.

Em 2012, submeti um projecto à Rádio Benguela, que foi inserido como rubrica semanal de meia hora no “Geração Viva”, do conceituado jornalista Gilceu de Almeida. O “Espaço Literatura - Entre o Livro e a Tradição Oral Africana” foi ao ar quatro vezes em Abril, sem gravar indicativo. Reunia informação cultural, entrevista (com os escritores David Capelenguela e José Luís Mendonça foi ao telefone), resenha de obras literárias e sabedoria popular. Tive de interromper a experiência para reavaliar alguns pressupostos.

E pronto, programa concebido! Mais um sonho. Para quando e onde a emissão? Não faço ideia. Que se mantenha ao menos a tradição dos directos. Ainda era só isso. Obrigado.

Gociante Patissa, Benguela | 23 Dezembro 2017 | www.angodebates.blogspot.com
Share:

0 Deixe o seu comentário:

A Voz do Olho Podcast

[áudio]: Académicos Gociante Patissa e Lubuatu discutem Literatura Oral na Rádio Cultura Angola 2022

TV-ANGODEBATES (novidades 2022)

Puxa Palavra com João Carrascoza e Gociante Patissa (escritores) Brasil e Angola

MAAN - Textualidades com o escritor angolano Gociante Patissa

Gociante Patissa improvisando "Tchiungue", de Joaquim Viola, clássico da língua umbundu

Escritor angolano GOCIANTE PATISSA entrevistado em língua UMBUNDU na TV estatal 2019

Escritor angolano Gociante Patissa sobre AUTARQUIAS em língua Umbundu, TPA 2019

Escritor angolano Gociante Patissa sobre O VALOR DO PROVÉRBIO em língua Umbundu, TPA 2019

Lançamento Luanda O HOMEM QUE PLANTAVA AVES, livro contos Gociante Patissa, Embaixada Portugal2019

Voz da América: Angola do oportunismo’’ e riqueza do campo retratadas em livro de contos

Lançamento em Benguela livro O HOMEM QUE PLANTAVA AVES de Gociante Patissa TPA 2018

Vídeo | escritor Gociante Patissa na 2ª FLIPELÓ 2018, Brasil. Entrevista pelo poeta Salgado Maranhão

Vídeo | Sexto Sentido TV Zimbo com o escritor Gociante Patissa, 2015

Vídeo | Gociante Patissa fala Umbundu no final da entrevista à TV Zimbo programa Fair Play 2014

Vídeo | Entrevista no programa Hora Quente, TPA2, com o escritor Gociante Patissa

Vídeo | Lançamento do livro A ÚLTIMA OUVINTE,2010

Vídeo | Gociante Patissa entrevistado pela TPA sobre Consulado do Vazio, 2009

Publicações arquivadas