quinta-feira, 16 de julho de 2015

Da série visitando o baú | O TEATRO, O INGLÊS E A OKUTIUKA DEFINIRAM RUMOS

O fim do contrato com a Sonamet (Sociedade Nacional de Metalurgia) e a entrada para o sector voluntário dá lugar a um desafio ainda maior. Estamos em 2000, tenho 22 anos, e a guerra civil tem fome de jovens sem poder de sobrenome. O sonho a realizar chama-se AJS (Associação Juvenil para a Solidariedade). ONG legalizada, equipa motivada. Recursos e capacidade metodológica… zero. E agora, por onde começar?

Ao mesmo tempo, não deixava de passar pela cabeça a ideia de emigrar em busca de melhores condições de formação, quando um só centavo não dispunha na conta bancária. O auto-didactismo na aprendizagem do inglês, iniciado aos 15 anos, fazia sonhar com uma chance de formação em comunicação num meio de expressão inglesa. Um aventureiro, eu? Talvez. Por vezes, o único recurso que resta a um sonhador é aquela certeza (estrutural) de que ainda não se é a pessoa que nascemos para ser nem se está no lugar que nascemos para estar. Este lugar pode ser cá, pode ser lá. Nunca ninguém o sabe ao certo, excepto o tempo, que cala sempre ao que a cada um reserva.
 
Sem escritório sequer, as reuniões aconteciam na escola Rei Mandume, não poucas vezes debaixo da árvore, por má-fé da direcção. Era preciso convencer a sociedade da nossa força interior, mais importante ainda era convencer a própria equipa internamente. A ADAMA chegou a ser sede provisória, gentileza do Bráulio (paz à sua alma).

De entre as mirabolantes ideias, agarrámo-nos à de adaptar para a televisão uma peça de teatro de minha autoria. A trama envolvia casal de pescadores e uma criança de rua por acolher, quando a penúria definia o próprio lar. Como mobilizaríamos nós a produção televisiva? Foi então que batemos à porta do líder da ONG Okutiuka, Zétó Patrocínio, que pelo projecto (hoje associação) Omunga fazia um notável serviço na área. Excluída a utopia da TV, ganhámos o convite para o workshop sobre elaboração de projectos, visando pertencer à Rede Municipal da Criança de Rua do Lobito (apoiada pelo INAC e Save the Children) e fomentar o teatro entre adolescentes. A partir dali a AJS definiu o seu rumo. Da minha parte, tudo o que vim a ser e fazer depois partiu de tal parceria.

Em 2003, conseguiu-se financiamento para o projecto «Palmas da Paz», que incluía programa radiofónico de debates, o qual realizei e conduzi através da Rádio Morena. Era o regresso ao aprender-fazendo em comunicação social, passados sete anos sobre o distanciamento do microfone da TPA, em cujo programa infanto-juvenil participava.

Quanto à experiência com ONG internacionais, em outubro de 2005 veio o contrato de consultoria pela Save the Children como Assistente de Líder de Pesquisa de grupos focais sobre crianças órfãs e vulneráveis no município da Tchikala Tcholohanga. Antes disso, tinha sido pesquisador também em grupos focais pelo NDI (National Democratic Institute) no Lobito. Em Março 2006, fui contratado pela Handicap International como Assistente da Coordenadora do Projecto RBC (Reabilitação Baseada na Comunidade), do qual me desvinculei ao cabo dos três meses experimentais devido ao baixo salário (USD 500) e ao ingresso na universidade Agostinho Neto em Benguela, que mais tarde se passou a chamar Katyavala Bwila, onde me licenciei em Linguística/Inglês em 2012.

Este é o 3.º relato do Baú, um encontro com as minhas memórias a rolo.
Gociante Patissa, 16 Julho 2015
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